Virando a Própria Mesa - parte 14: O lado de cá
Completei já 2 semanas de Austrália que mais parecem 2 anos
ao mesmo tempo em que parecem 2 dias. Como eu já havia vindo pra Sydney de
férias por 1 mês no ano passado, passei adiante os programas turísticos e por conhecer previamente a cidade já consigo
me localizar e me deslocar com relativa facilidade. Também já incorporei alguns
costumes da rotina australiana como acordar e dormir cedo, fazer do café da
manhã um almoço e andar de pés descalços na rua (já fui ao supermercado fazer
compras sem sapatos). Minha adaptação neste sentido está sendo perfeita.
Mas há o outro lado, aquele que requer mais tempo e que é
mais difícil: o pessoal e o profissional. Ainda não tenho um trabalho e acho que o tempo
ocioso é o que tem me abalado mais. O que me mata, no entanto, não é ficar sem
nada pra fazer, mas sim a dúvida e a expectativa sobre se serei capaz de arranjar
alguma coisa pra fazer, por mais simples que ela possa ser. Meu plano inicial
por aqui é trabalhar como garçonete, coffee maker ou atrás de um balcão de bar
servindo cerveja pelo menos nos 2 primeiros meses, de modo que eu possa pegar
maior fluência no inglês e entender um pouco mais sobre a cultura australiana. Trabalhos
fáceis, certo? Errado. Pra quem nunca foi garçonete, coffee maker ou nunca
operou uma máquina de cerveja, isso pode ser bem difícil. Mas, enfim, minha
proposta ao mudar de país e fugir da minha zona de conforto era justamente me
desafiar e aprender coisas novas.
No primeiro dia em Sydney já descolei um Trial (teste) como
garçonete num café onde um amigo trabalha. Lá fui eu de avental, bloco e caneta
em punho anotar os pedidos dos clientes, limpar mesas, levar as refeições. Foi bom
e fácil, mas infelizmente não consegui o trabalho porque eles queriam alguém
que tivesse experiência como barista e não me arrisco nem a fazer um teste como
tal, já que preparação avançada de cafés ainda não é meu forte embora tenha
feito um curso na área.
Uma semana se passou depois disso e nesse tempo comecei a
ficar extremamente angustiada e preocupada. Junte-se a isso a saudade de todo
mundo que ficou no Brasil, a mudança brusca de vida e tem-se um cenário quase devastador.
Mas mesmo nesses momentos difíceis que vivi até agora (e nem posso dizer que
foram difíceis porque sei que coisas mais terríveis ainda vão acontecer), não
tive vontade de desistir e voltar atrás. Não me arrependi de ter deixado tudo e
todos no meu país de origem pra vir servir mesas e limpar chão aqui. Sim, me
perguntei algumas vezes “o que eu to fazendo da minha vida?”, mas sempre encontrei
as respostas dentro de mim. E é justamente isso o que me leva adiante e me faz
secar as lágrimas e seguir o caminho que eu mesma defini. “Pra chegar ao
castelo é preciso nadar pelo fosso”, e acredito muito nisso.
No sábado, exatamente quando completava 15 dias de vida nova
aqui, fui fazer outro trial numa pizzaria perto de onde moro. Foi bacana,
curti. Ontem o dono da pizzaria me ligou me pedindo pra voltar e lá fui eu pro
meu primeiro dia de trabalho de fato, com direito a pagamento no final e tudo. Anotei
pedidos, limpei e servi mesas, lavei e sequei louça, passei mop no chão no
final do expediente, às 22h. E enquanto fazia tudo isso, não tinha tempo pra pensar que horas mais cedo eu estava extremamente triste e angustiada e que fui salva por um amigo querido do Brasil via What's Up. Recebi meu dinheiro e saí contente e sozinha por
uma rua completamente deserta e escura, caminhando tranquilamente com meu
celular na mão sem medo algum de ser assaltada ou de alguma forma violentada. Entrei
no ônibus e 10 minutos depois estava em casa, sã, salva e me sentindo útil e
esperançosa.
Tenho certeza que pra muita gente isso vai soar como um
drama desnecessário, um exagero. Torço pra que seja mesmo. E espero mais ainda
que tudo seja só uma questão de tempo, como me dizem os amigos que escutam os
meus desabafos nesses momentos de aflição e aqueles que ja passaram por isso antes. Quando consigo desligar meu
pensamento dessas coisas, trato de aproveitar meu tempo livre debaixo de um céu
azul e com vista estonteante pro mar calmo.
É tudo o que eu posso fazer por enquanto.
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