A caixa de fotos
Sem razão nem porquê, hoje abri a gaveta do
passado e dei de cara com a nossa cara nas tantas fotos que tiramos juntos
quando um dia formamos um casal.
Aqui e agora aquelas cenas todas que vivemos
juntos não me dizem mais nada, embora sejam pistas importantes que me ajudam a
entender um monte de coisas que se passaram naquele momento em que o flash da
câmera iluminava os nossos sorrisos. Vejo naquelas fotos meu olhar sempre
triste, talvez perdido, buscando alguma coisa sobre a qual eu não poderia fazer
ideia do que era. Enxergo a tua aflição e o teu desconforto encarando a velha
máquina fotográfica analógica. Os retratos que tiramos mostram hoje um nítido reflexo
dos nossos corações conturbados de um tempo que passou, mas que nunca fomos
capazes de enxergar tão cegos que estávamos por aquela paixão.
Estranhamente não senti saudade e isso me é
libertador. Significa que tudo aquilo que vivemos encontrou no meu universo particular
um espaço próprio e reservado para repousar no tempo da minha existência. Não fui
capaz sequer de me reconhecer nas imagens; aquela que sorria e olhava pra
câmera não é essa mesma que escreve esse texto. O intervalo que se estende
entre nós não é tão longo assim, porém, é esclarecedor, intenso, determinante,
e foi capaz de me redefinir por completo. E era disso que eu falava naquele
tempo: de redefinição. Porém, não eras capaz de entender, mas nem por isso te
culpo.
Fostes meu espelho, meu amor e inimigo. Tivesse
na minha vida o mais importante dos papeis: o de me libertar de tudo pra que eu
fosse capaz de encontrar comigo mesma. A tua câmera me abriu os olhos pra que
eu pudesse me enxergar.
E a fotografia que tenho de mim mesma agora é a
que mais gosto.
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